Notas sobre Oriente e Ocidente (Daniel Placido)
I-"Ocidente" e "Oriente" não são voláteis apenas do ponto de vista histórico e geográfico, mas fronteiras móveis em termos de significação cultural. Feita essa observação preliminar, é possível identificar pelo menos seis grandes "ondas" de "fascinação ocidental" pelo "Oriente": a) período helenístico na Antiguidade, marcado pelo intercâmbio e sincretismo entre greco-romanos e povos orientais; b) período renascentista, caracterizado pelo sincretismo filosófico e religioso impulsionado, sobretudo, pela migração de sábios bizantinos para a Itália e pela tradução de textos antigos; c) orientalismo europeu profissional, emblematizado pela tradução e estudo de textos clássicos da religião e filosofia orientais, especialmente os da Índia; d) orientalismo romântico-literário, dos irmãos Schlegel a Hesse, passando por Nerval;, e) novoerismo e contracultura, identificado pela invasão religiosa oriental do Ocidente e pelo ecletismo vertiginoso; e) globalização, representada pela padronização cultural mas também pelo multiculturalismo. Cada um desses momentos precisa ser pesquisado e interpretado a fundo.
II- O Ocidente parece voltar-se para o Oriente tanto como fonte de inspiração quanto como refúgio da espiritualidade, há muito tempo. Alexandre teria encontrado na Pérsia a taça de Jamshid; no Hino da Pérola, atribuído a Bardesanes, o príncipe viaja pelo Egito em busca de um tesouro perdido; Preste João levou o Graal consigo para as "Índias" (provavelmente a Etiópia); os rosacruzes abandonaram a Europa e foram para a Índia; Swedenborg viu o Graal, a Palavra Perdida, em algum lugar na Mongólia.
III- O Oriente, diz Corbin, seguindo aqui Sohravardî, não se restringe a um sentido geográfico. Para o sheikh Ishraq, o Oriente maior é o mundo angélico; o Oriente menor é o mundo da alma; e entre eles, está o Oriente médio, o mundo imaginal. A alma está presa neste mundo material, o Ocidente, e deve se elevar para o Oriente espiritual em que as luzes inteligíveis refulgem dentro dela como a aurora nascente. Nesse Oriente místico e visionário encontram-se todos os gnósticos, todos os exilados anímicos que voltaram para casa, sejam "ocidentais" como Boehme ou Swedenborg, sejam "orientais" como Sohravardî ou Molla Sadra.
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