Poetas platônicos I: Percy B.Shelley (por Daniel Placido)
O poeta romântico inglês Percy B. Shelley não só estudou e traduziu obras de Platão a partir do grego, como leu Santo Agostinho e Ficino, assim como conheceu os neoplatônicos através de Thomas Taylor.
Em sua obra "Uma Defesa da Poesia" ele diz:
"Platão, seguindo as doutrinas de Timeu e de Pitágoras, pregou também um sistema doutrinário moral e intelectual, que abrangia ao mesmo tempo a condição humana passada, presente e futura. Jesus Cristo revelou à humanidade as verdades sagradas e contidas nessas visões, e o Cristianismo, em sua pureza abstrata, tornou-se a expressão exotérica das doutrinas esotéricas da poesia e da sabedoria da antiguidade."(p. 187); "Platão era essencialmente um poeta - a verdade e o esplendor de suas imagens, assim como a melodia de sua linguagem possuem uma intensidade tão grande quanto se possa conceber."(Ibidem, p. 175)
Naturalmente essas referências à Platão, à religião e ao esoterismo podem parecer estranhas em um autor conhecido amiúde como um defensor radical do ateísmo.
Na realidade, o debate sobre o "ateísmo" foi um grande debate de geração que envolvia os intelectuais da época, tanto iluministas quanto românticos, de Holbach a Blake. Não necessariamente era uma negação literal da existência de Deus, mas muito mais sobre assumir uma posição claramente heterodoxa em religião.
Com a obra "A necessidade do ateísmo" Shelley participou desse contexto, sendo antes de tudo um texto provocativo de juventude; apesar dele ter voltado ao ateísmo em outros textos (como "Queen Mab"), sua maturidade intelectual só ocorre depois, a partir de 1815. Não por acaso, no texto "A Revolta do Islam", de 1817, Shelley escreve no prefácio que não nega a existência do Ser Supremo, e sim a ideia vulgar sobre ele, que considera odiosa.
Sabe-se que Shelley aceitava a existência de um Espírito do Bem, ainda que não seja claro se ele pode ou não ser identificado a um Deus pessoal. De todo modo, flertou com o espinosismo e o panteísmo.
Ademais, é fato que Shelley reconhecia a imortalidade da alma, cuja existência deriva da Alma do mundo, nesse sentido também podendo ser considerado um platônico, ainda que sob tinturas românticas. Shelley era igualmente platônico em sua valorização da imaginação metafísica, e talvez a poesia fosse o mais perto de uma religião para ele.
Referências bibliográficas
A Revolta do Islam, Percy Bysshe Shelley, In: Cadernos de Tradução, Porto Alegre, no 36, jan-jun, 2015, p. 1-116
Defesas da Poesia, Sir Philip Sidney e Percy Bysshe Shelley, Iluminuras, 2000.
Romantic Atheism: Poetry and Freethought, 1780–1830, Martin Priestman, Cambridge University Press, 2009.
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