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Zoroastro e o zoroastrismo (por Daniel Placido)

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  Quem foi Zoroastro? E o que é o Zoroastrismo? Zaratustra (conhecido em grego como Zoroastro ) foi um sacerdote e reformador religioso do antigo Irã, que teria vivido entre 1500 e 1200 AEC, embora algumas estimativas o situem entre 1000 e 600 AEC. Segundo a tradição, enquanto se banhava em um rio, Zoroastro teve uma visão de uma entidade angélica que se apresentou como emissária de Ahura Mazda, o Senhor Supremo. Essa entidade o levou à presença do Ser Supremo, que lhe revelou a verdade, marcando o início de sua missão profética. O zoroastrismo (às vezes chamado de mazdeísmo) é uma religião que combina elementos do monoteísmo com um dualismo teológico. Ahura Mazda (também chamado de Ohrmazd) é o Senhor Supremo e Sábio, criador da distinção primordial entre asha (verdade, ordem cósmica) e druj (mentira, caos). Dele teriam nascido dois espíritos gêmeos, cada um fazendo uma escolha: Spenta Mainyu (Espírito Benfazejo) optou pelos bons pensamentos, boas palavras e boas ações; e An...

O que é o sufismo? (por Daniel Placido)

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  Toda religião tradicional tem uma dimensão interior ou mística, assim como toda letra tem seu espírito. No caso do Islã, ela é conhecida, especialmente entre os sunitas, como sufismo (tasawwuf). Esse aspecto interior da religião islâmica teria sido revelado pelo profeta Muhammad a seus discípulos mais próximos ou companheiros, e assim sucessivamente. O profeta Muhammad é considerado, não por acaso, o modelo do Homem Perfeito para sufis. O sufismo não tenciona contradizer a sharia (lei islâmica) nem a teologia, mas complementar e aprofundar aspectos delas. Os sufis acreditam no que todo muçulmano verdadeiro acredita e seguem rigorosamente as normas práticas da religião, encarando-as não só pelo seu aspecto externo, mas também pelo aspecto interno. Por exemplo, o sufi Ibn ‘Arabî disse que cada prostração da oração islâmica está associada a um reino da existência (mineral, vegetal, animal). Eles praticam o que todo muçulmano pratica, assim como fazem orações, meditações, jejuns e ou...

Roger Garaudy e o Islã (por Daniel Placido)

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Roger Garaudy foi um dos maiores intelectuais do século XX. Inicialmente cristão, aderiu ao Partido Comunista e à Resistência Francesa  contra a ocupação nazista. Foi parlamentar, e depois tornou-se, especialmente entre os anos 1950-60, o principal ideólogo marxista do Partido Comunista Francês, ainda que rompendo com a dogmática estalinista. Ao mesmo tempo, propunha um diálogo entre cristãos e marxistas. Nos anos 1970 foi excluído do Partido Comunista devido à heterodoxia de suas posições ideológicas. Em 1982 Garaudy reverteu-se ao Islã, de forma surpreendente. Em sua autobiografia “Minha Jornada Solitária pelo Século” (1996, original de 1989) o assunto da reversão é, naturalmente, abordado. Particularmente em uma entrevista anexa ao livro (pp. 281-289), Garaudy considera que os motivos que o atraíram ao Islã foram basicamente dois.  O primeiro é o fato de que o Islã é, a seu ver, uma religião essencialmente ecumênica, pois não se coloca como uma religião nova, e sim como a c...

Filosofia como modo de vida (por Daniel Placido)

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  À luz dos estudos de figuras como Pierre Hadot, Giovanni Reale, Michel Foucault, entre outros, podemos considerar que a filosofia na Antiguidade, de Sócrates a Plotino, passando pelos cínicos, estóicos e epicuristas, consistia, fundamentalmente, em um modo de vida. Não havia, nesse contexto, uma cisão entre teoria e prática, pensamento e ação, sabedoria e vida, mente e corpo. O estudo de disciplinas filosóficas como a lógica e a metafísica, por exemplo, era acompanhado pari passu por práticas espirituais e exercícios meditativos interiores que, através do autoconhecimento e do cuidado de si, promoviam uma forma de vida integrada, na qual todas as dimensões do ser humano eram articuladas em função de sua atuação ética no mundo.        Escola de Aristóteles, Spangenberg. Ao trazer essa concepção para o presente, sem, porém, discutir aqui as razões históricas mais profundas desta mudança cultural, considero relevante destacar que, embora a universidade proporc...

Fenomenologia em R. Steiner, H. Corbin e R. Abellio (por Daniel Placido)

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  Enquanto alguns autores esotéricos no século XX procuraram contrapor de forma irremediável Tradição esotérica e ciência/filosofia modernas, outros pensadores trilharam um caminho de conciliação e diálogo entre ambas as áreas de conhecimento. Entre eles, abordarei três filósofos distintos, que, todavia, estiverem intimamente relacionados à moderna fenomenologia: R. Steiner, R. Abellio e H. Corbin. A fenomenologia foi criada no começo do século XX por E. Husserl (1859-1938) em um contexto em que o positivismo lógico e o fisicalismo eram influentes na filosofia e nas ciências. Husserl, a partir do conceito de intencionalidade, considerou que toda consciência é consciência de algo, ou seja, está direcionada a um objeto que, por sua vez, apresenta sentido para ser captado por ela, em uma unidade indissolúvel. Seria assim a fenomenologia um método de captar e interpretar o sentido ou a essência das coisas tais como se mostram à consciência, ou seja, uma ciência eidética baseada na in...

H. Kelsen sobre o "gnosticismo" em Voegelin

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Hans Kelsen “ A especulação gnóstica, tal como a religião de Mani, se remete à oposição entre os reinos do bem e do mal, da luz e das sombras, do mundo espiritual e do material. Em princípio, é o mesmo dualismo que o das esferas espiritual e temporal aceito na doutrina da Igreja medieval, com a diferença de que a especulação gnóstico-maniqueísta mostrava uma tendência tão forte a identificar a esfera material da vida humana quase por completo com o reino do mal, e a opô-la em grau tão radical com o espiritual – a única esfera divina em sua concepção -, que essa esfera material podia ser considerada, de alguma maneira, desdivinizada. Se o movimento questionado é o que na história da religião em geral se denomina de gnosticismo, seu propósito é justamente o contrário do que Voegelin atribui ao que ele chama de gnosticismo. O gnosticismo histórico não divinizava senão melhor [dizendo] desdivinizava, por suposto não o mundo ou a sociedade, senão a esfera material da vida humana. Ainda que ...

O "combate pela Alma do Mundo" (por Daniel Placido)

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Como disse F. Lenoir, a modernidade filosófica e científica transformou a natureza em um todo reduzido à relações mecânicas, de partes justapostas e apreendidas de forma racional e matematizada, rejeitando a ideia da natureza como um ser dotado de Alma, com relações simpáticas e antipáticas dentro de si, fundamento da magia e da imaginação como mediadora entre os níveis de realidade. Como reação a este processo, teremos a teosofia de Boehme, Swedenborg e outros, além da Filosofia da Natureza romântica de inspiração teosófica (Novalis, Schelling, Schubert), que insistirá em compreender a natureza como um ser orgânico e anímico, um todo em que as partes se relacionam por analogias e correspondências, e considera o próprio homem como um microcosmo à luz do macrocosmo.  Ademais, a modernidade foi marcada pela ascensão do racionalismo filosófico que, entre outras consequências, restringiu o status ontológico da imaginação, confundida com a fantasia (a "louca da casa"), como uma m...